Projeto estimula produção orgânica
Muitos não sabem, ou ignoram, mas as verduras consumidas por boa parte das famílias natalenses até hoje é cultivada a partir da utilização de Tamaron BR e Decis 25EC. Por trás dos nomes técnicos, difíceis, estão duas substâncias pesticidas com toxicidade suficiente para provocar câncer. Os riscos aos quais a população natalense tem estado submetidos podem acabar em breve. Um projeto firmado em parceria pelo Ministério Público Estadual com a Petrobras, o Sebrae e a Emater promete substituir o cultivo com agrotóxicos por uma agricultura orgânica na comunidade de Gramorezinho, na zona Norte de Natal.
Alberto Leandro
O uso de agrotóxicos na produção de alimentos na comunidade de Gramorezinho é tradicional
O convênio entre as instituições será assinado hoje, às 15h, na sede da Petrobras, no bairro de Cidade da Esperança. O Projeto Amigo Verde, segundo dados da promotoria do Meio Ambiente, irá beneficiar diretamente 120 famílias - cerca de 500 pessoas - e indiretamente toda a população de Natal. O objetivo é substituir paulatinamente o uso do agrotóxico pelo cultivo orgânico, saudável, a partir da assistência técnica da Emater e do incentivo ao empreendedorismo do Sebrae. Como a mudança exige necessariamente um período de diminuição do atual ritmo de produção, haverá um subsídio de cerca de R$ 400. O investimento é de R$ 1 milhão.
A tarefa dos executores do projeto não será fácil. O uso de agrotóxicos na comunidade é tradicional. Há muitos anos, segundo os próprios agricultores, o "veneno", como é popularmente chamado, é a condição básica para que o alface, o coentro, a cebolinha, o pimentão, entre outras hortaliças, consiga crescer no solo daquelas terras, por onde passa o rio Doce. Essa forma de gerir a plantação vinha sendo repassada naturalmente dos mais velhos para os mais novos, de forma indiscriminada. Os agricultores não têm uma noção muito exata dos motivos pelos quais é necessário usar os pesticidas, mas usam. Sabem que até hoje sem o "veneno" não cresce nada, enquanto que com o "veneno" é possível colher o que foi plantado.
Mesmo com o costume arraigado entre os agricultores do Gramorezinho, a aceitação de todas as 120 famílias foi considerada exemplar pela promotoria do Meio Ambiente. Formada basicamente por agricultores familiares, salvo raras exceções, a comunidade está, segundo um de seus representantes, José Alves, animada. "A gente fazia errado porque não sabia, não tinha acompanhamento apoio. Agora, está todo mundo animado", diz José Alves, que é representante da Associação de Amigos e Moradores do Sítio Gramoré e Adjacências.
Esse acompanhamento será realizado pela Emater e pelo Sebrae. Além de conseguir livrar a produção de hortaliças do Gramorezinho, um dos principais fornecedores dos produtos comercializados nas feiras livres da cidade, dos pesticidas, o Amigo Verde irá agregar valor a essa produção. Não é segredo que um produto mais saudável, descontaminado, tem maior valor de mercado. Segundo o agricultor José Alves, esse peso já era sentido pela comunidade, que havia sido impedida de vender para o Governo Federal por conta do agrotóxico. "Vamos ter uma melhoria na renda também", encerra.
Além do ganho social do projeto, o Ministério Público Estadual destaca, no texto que submeteu a Petrobras, as melhorias ambientais. Não era somente as mesas de jantar dos natalenses que recebiam resíduos provenientes dos pesticidas. O solo da comunidade do Gramorezinho e até mesmo o rio Doce, que passa por aquelas terras, sofre o perigo de contaminação por conta dos agrotóxicos. A promotoria do Meio Ambiente, através da promotora Gilka da Mata, alerta para essa contaminação.
Na última semana, uma equipe da UFRN foi até a comunidade para colher material para análise. Tanto a água quanto o solo, em pontos diferentes da região, tiveram amostras coletadas. A partir disso, poderá se obter um marco para trabalhar futuramente. "Com essas análises, nós teremos como definir o nível de contaminação atual e acompanhar a evolução desse quadro ao longo do projeto", afirma Ana Cláudia, urbanista que atua como assessora técnica na promotoria do Meio Ambiente.
Laudos realizados em 2009 em mercados de atacados e supermercados mostram a existência de resíduos de agrotóxicos em produtos advindos da comunidade do Gramorezinho. Um relatório técnico produzido pela Covisa também demonstra essa contaminação.
Bate papo
Luiz Ferradans, gerente geral da Petrobras no RN
Como surgiu a ideia para o projeto?
Partiu de uma iniciativa da promotora Gilka da Mata, que iniciou um contato com a Petrobras e os outros parceiros. O projeto foi produzido e estruturado e foi contemplado por se tratar de uma iniciativa que vai ser positiva para as 120 famílias envolvidas e para toda a cidade. O convênio será assinado entre a comunidade, a Petrobras, o MPE, o Sebrae e a Emater.
Em qual linha da Petrobras o projeto se insere?
A linha de desenvolvimento sustentável e cidadania, onde nós investimos em projetos no Brasil todo. O objetivo é qualificar trabalho e renda.
Esse é um projeto que não se insere na atividade-fim da Petrobras. O investimento, no caso, é em responsabilidade social?
O investimento é na qualificação das pessoas. A Petrobras identifica nesse projeto uma oportunidade muito boa para modificar a forma de produção daquela comunidade, que passará a ser voltada para a agricultura orgânica. Isso inclui também as formas de comercialização do produto desse cultivo, o empreendedorismo.
Há casos de produtores que não se encaixam como agricultores familiares? Eles serão contemplados?
Não. Serão contemplados somente os agricultores familiares. O projeto está focado nisso. Essas pessoas receberão um subsídio para poder se sustentarem no período de diminuição dessa produção. O projeto é voltado unicamente para a agricultura familiar.
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