quinta-feira, 5 de julho de 2012

SAÚDE DO RN: CALAMIDADE PÚBLICA

Decreto divide opiniões de entidades
   
Imagem/Arquivo Blog "naserra"
 O decreto de calamidade na Saúde Pública do Rio Grande do Norte dividiu a opinião de entidades ligadas ao setor, políticos e representantes de categorias. Para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RN), o documento é positivo porque traz consigo um plano de enfrentamento com ações e metas a serem cumpridas passíveis de fiscalização eficaz por parte dos órgãos de controle. Por outro lado, o Sindicato dos Médicos do Estado (Sinmed/RN) aponta defeitos no plano e alerta para a possibilidade da situação de calamidade se aprofundar.

O anúncio do Governo do Estado surge em meio à uma greve dos médicos da rede estadual que permanece há mais de dois meses. O presidente do Sinmed/RN, Geraldo Ferreira, afirmou que já sabia do decreto desde a semana passada. "Já estávamos esperando esse anúncio. A situação atual não é apenas de estado de calamidade, é de desgoverno mesmo", disse. O médico teme que o decreto abra brecha para contratações e atitudes irregulares. "O que vemos acontecer, em casos parecidos, é a tentativa de possuir poder absoluto e contratar desobedecendo preceitos existentes em leis".

A conselheira federal da OAB no Estado e integrante do Fórum da Saúde Pública do RN, Elke Cunha, afirmou que o decreto, apesar de representar um desgaste político para o Governo, é visto positivamente. "Esse decreto de calamidade difere de outros porque existe um plano de enfrentamento. Esse plano tem metas e ações definidas  que serão fiscalizadas", pontuou.

Mas alguns pontos existentes no plano são questionados pelo Sinmed/RN e Sindicato dos Trabalhadores em Saúde do Estado (Sindsaúde/RN). Um deles é a construção de um hospital de trauma na Região Metropolitana de Natal através de uma Parceria Público-Privada (PPP). "Somos contra a PPP. A própria governadora sabe que modelo é contestado pelo Ministério Público de outros Estados. Já alertamos o Governo que essa é uma atitude incorreta que vai acabar desorganizando ainda mais o setor", colocou Geraldo Ferreira. Já a presidente do Sindsaúde/RN, Sônia Godeiro, afirmou que a PPP nada mais é que a privatização da saúde pública. "Isso é errado. Não pode entregar à empresas privadas uma função que é do Estado".

Para o membro do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Francisco Júnior, o decreto é preocupante. "Lamentavelmente, usa-se os decretos de calamidade para tomar atitudes à revelia da Justiça e dos controles externos. Espero que o Governo do Estado tenha bom senso e não adote medidas polêmicas", colocou. O representante do CNS disse ainda que esteve na última reunião do Conselho Estadual de Saúde (CES) e está acompanhando a situação nos hospitais públicos do RN. "Estou acompanhando de perto o que ocorre e esse decreto, antes de nos parecer uma solução, se apresenta como uma preocupação".

Não é o que pensa o presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Norte (Cremern), Jeancarlo Cavalcante. De acordo com o médico, a atitude do Governo é uma medida necessária para enfrentar o "caos existente". "O decreto de calamidade é uma medida necessária e a atitude do Governo é louvável. Mostra que há vontade de resolver os problemas", colocou.

Outro ponto que não agrada médicos e servidores da Saúde é com relação ao controle de escala previsto no plano de enfrentamento. O Governo quer que a escala de todos os médicos do Estado seja publicada no site da secretaria de Estado da Saúde Pública (Sesap) e encaminhada ao Cremern e Ministério Público. A adoção de ponto eletrônico em todas as unidades hospitalares também está prevista. "O controle da frequência do médico não deve ser visto como uma punição. A presença do médico vai além de assinar um ponto de controle. O nosso compromisso está acima disso", afirmou Geraldo Ferreira.

Folha da Sesap consome 80% dos recursos

Conforme dados apresentados pela Procuradoria Geral do Estado ao Juízo da 4ª Vara da Fazenda Pública como parte da peça de defesa em desfavor da Ação Civil Pública movida contra o Estado pelo Conselho Regional de Medicina (CRM), há uma descrição dos valores gastos com a Saúde em nível estadual no ano passado. Dos R$ 5,2 bilhões da receita vinculada à Saúde do Rio Grande do Norte, somente o equivalente a 3,8% - cerca de R$ 199,6 milhões - foram utilizados para investimentos. Atualmente, a folha de pagamento de servidores da Secretaria Estadual de Saúde (Sesap) consome 78,06% de toda a arrecadação e repasses destinados à Saúde.

 Os 21,94% restantes são divididos entre os pagamentos realizados às cooperativas médicas, que segundo dados apresentados pela Procuradoria Geral do Estado, somaram no ano passado cerca de R$ 24 milhões. Há, ainda, o repasse efetuado às empresas terceirizadas, que disponibilizam mão de obra para serviços gerais, copa, segurança interna e externa das unidades estaduais de Saúde. Em 2011, as contratações indiretas de pessoal custaram à Secretaria Estadual de Saúde (Sesap), aproximadamente R$ 36 milhões.

 "O Estado do Rio Grande do Norte gasta cerca de 17,32% do seu orçamento em Saúde Pública, bem mais do que exigido pela Constituição (12%), mas, em razão de desacertos que vem se acumulando ao longo dos anos (que não se conserta de uma hora para outra), 80% dos recursos da Saúde (isso mesmo, 13,52%!!!) são gastos com pessoal, sobrando pouco para custeio e quase nada para investimento. Essa é uma verdade que não se pode - nem se deve - esconder", alegou a procuradora estadual da Saúde, Paula Maria Gomes da Silva, em documento entregue à Justiça Estadual.

 A Procuradoria Geral do Estado sugeriu, como parte do processo de identificação das deficiências históricas da Saúde Estadual, uma auditoria na folha de pagamento na Secretaria Estadual de Saúde (Sesap). Na peça de defesa em resposta à Ação Civil Pública movida contra o Estado pelo CRM, a procuradoria disse que "os números não mentem. Uma auditoria, que deverá ser feita no curso da ação, mostrará isso claramente".




Fonte:   Jornal  Tribuna do Norte
Isaac Lira, Roberto Lucena e Ricardo Araújo - repórteres

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